O estudo de temas que abarcam a adoração deve conduzir a um estilo de vida que abarca o homem em todo seu ser: corpo, alma e vontade (Dt 6.5). A adoração bíblica englobará tanto os elementos da alma, como os do corpo. Por isso, pode-se dizer que a adoração é uma experiência tanto do interior como do exterior do homem; o que se declara com o coração se materializa com atitudes. De fato, são encontrados muitos textos bíblicos que falam da adoração ligada à busca de santidade e do amor a Deus (interior), bem como do serviço religioso e a vida de comunhão com os irmãos (exterior). Essa ligação, em muitos textos da Escritura, será feita com os sentidos humanos.
Porventura, não são os sentidos do homem a visão, a audição, o paladar, o olfato e o tato? Sim, são esses. O homem faz contato com o mundo material através de seus sentidos. Ele vê tudo aquilo que reflete luz; ele ouve tudo o que possui vibrações, aquilo que seus tímpanos podem capitar; ele discerne tudo que é doce ou salgado pelo paladar; ele reconhece um bom ou mal perfume pelo olfato; enfim, ele toca as coisas e diferencia a matéria. Não sendo diferente tal manifestação com a adoração bíblica, pode-se perguntar: qual a ligação dos sentidos humanos com a adoração nas Escrituras Sagradas?
1) VENDO A DEUS (Jo 1.18; Is 6.1; 1 Jo 3.6)
2) OUVINDO A DEUS (Jo 8.47; Mc 9.5-7)
Segundo o apóstolo João ninguém, jamais, viu a Deus. Como bem declarou o afamado escritor Dr. Russel Shedd*, “ninguém jamais viu o que os olhos físicos não podem ver”. Todavia, a presença e glória divinas comunicam-se com aqueles que estão dispostos a se submeterem ao Deus Todo Poderoso (Is 55.6), e somente a eles. Se alguém não buscar ou perceber essa presença divina... bem, leia Dt 31.18 e Sl 102.2.
Na Bíblia, homens santos viram a Glória de Deus,** a exemplo do profeta Isaías. Os textos joaninos denotam que quando se vê a Cristo se vê a glória do Senhor. Na verdade, parafraseando tais textos, pode-se dizer que Cristo é aquele que santifica os lábios que de outra forma estariam impuros para cantar louvores ao Senhor; que Deus habita no meio de seu povo, pois a Igreja é o Santuário do Espírito Santo, como o próprio apóstolo Paulo afirma em 1 Co 3.16-17. Assim, "a vinda de Cristo deu início a uma nova era, mas não a uma nova adoração e sim a uma adoração mais completa" (Weller). Nesse sentido, adorar é comparável ao processo de ver. A visão espiritual formará a imagem de Cristo em cada um dos cristãos. Como adoradores, se tornarão mais semelhantes a Jesus (2 Co 3.18; Cl 3.10).
2) OUVINDO A DEUS (Jo 8.47; Mc 9.5-7)
A comunicação, através da língua e do ouvido, é a chave do relacionamento humano. Semelhantemente, Deus se relaciona e/ou se comunica com seus adoradores. Ora, adorar pressupõe que o Senhor se comunica e que os homens são capacitados a ouvir sua Voz que não emana de nenhum ser criado, mas somente do Criador, sendo perceptível apenas pelo Espírito Santo de Deus. Quando se cultua a Deus deve-se esperar ouvir a Voz que se faz audível ao ouvido do homem interior através da Palavra inspirada.
Em toda a Bíblia, desde o Éden, Deus se comunica com os homens. Esses o ouvem e se comunicam com Deus. Abraão, por exemplo, sabia que era Deus quem pedira seu filho e não uma voz oriunda do inferno (Gn 22.2). O próprio Jesus é chamado "logos", que significa "palavra" (Jo 1.1, 14; 1 Jo 1.1; Ap 19.13). Em suma, quem é de Deus ouve as palavras de Deus (Jo 8.47). Esse, por ser real, não se guarda em silêncio. Deus se comunica (Sl 19.1). Quem tem ouvidos, OUÇA, o que o Espírito diz às igrejas (Ap 2.7, 11, 17, 29; Ap 3.6, 13, 22).
3) PROVANDO A DEUS (Sl 34.8; 1 Pe 2.2-3, Jo 6.27, 35, 37; Jo 4.34)
Alguns textos da Bíblia apontam para uma adoração através da experiência de provar ao Senhor, no sentido literal de "saborear". Talvez alguém pergunte: "a Bíblia falaria sobre isto?" O que dizer, por exemplo, do genuíno leite espiritual de Pedro? Em 1 Pe 2.3 a palavra para "experiência" é "saboreastes". Isso significa que Deus precisa ser experimentado com mais profundidade em nossa adoração. É o que a expressão "bondoso" conotará. Há outros exemplos, como o da mulher samaritana, a qual Jesus incentivou a beber da água da vida (Jo 4.10).
Alimentar-se de Cristo significa recebê-lo pela fé e dele desfrutar, pois é o Pão da vida (Jo 6.27, 35, 37). Sem dúvida, o ato de comer pão tem importância secundária. O que realmente importava era a comida substancial que consistia em fazer a VONTADE DO PAI (Jo 4.34). Como não lembrar da tentação no deserto (Mt 4.3)? Portanto, deleite-se em comer desse maravilhoso maná espiritual oferecido por Cristo. Tenha apetite espiritual. Como bem destacou Shedd, “o cristão recebe e digere o pão que vem do céu por meio da comunhão pessoal, leitura das Escrituras, louvor, gratidão, oração e obediência...".
4) EXALANDO O BOM PERFUME PARA DEUS (2 Co 2.15)
"Venho Senhor minha vida oferecer, como oferta de amor e sacrifício...". Costuma-se cantar muito esse louvor nas igrejas. Note: ela fala de um outro sentido ligado a adoração. Sim, Deus se agrada do bom perfume de sacrifícios a ele oferecidos; é necessário que a Igreja exale tal perfume, pois essa figura ensina que é Deus quem recebe a adoração, o que me lembra a canção do poeta e pastor Daniel de Souza: "somos um jardim diante do Senhor... Somos o bom perfume de Cristo, exalando o cheiro de vida".
Contudo, há um outro lado da moeda: quando a adoração não é um bom perfume, é um “mau-cheiro” (Is 1.13-15; Ml 2.17). O profeta Isaías viu a banalização do sagrado; os afazeres cultuais no Templo eram relaxados e sem profunda contrição na presença da glória de Deus. “Sacrifícios cheiram mal a Deus, inevitavelmente, quando sofrem os efeitos nefastos de corações que abrigam iniquidade sem arrependimento” (Shedd).
Entenda. Cristo foi O sacrifício, feito de uma vez por todas, por sua Igreja. Assim, tudo que o povo de Deus fizer pautado nesse sacrifício supremo será um bom perfume ao Senhor, porque é por meio de Jesus (Hb 13.15-16). A Igreja precisa ser o bom perfume de Cristo que exala aroma de vida para a vida (Ap 4; Ap 5).
5) TOCANDO A DEUS (Mt 9.21, Mt 14.36; Mc 3.10; Lc 22.51; I Jo 5.18)
Tocar é ter contato com, é sensibilizar, comover. Na adoração bíblica é possível tocar em Deus. A leitura dos textos supracitados não se aplica a um desejo de tocar literalmente o Senhor, como alguns imaginam ser possível na adoração contemporânea, mas sim, desejar tocar a Deus no sentido de se sensibilizar com a sua presença, entendendo que somente Ele pode ajudar completamente. Tais textos ensinam três princípios fundamentais: (1) que se deve tocar o Senhor; (2) que o Senhor toca aqueles que o buscam; e (3) que o maligno não tocará naqueles que são tocados pelo Senhor.
Uma vez que se busca ter contato com Deus pode-se ter a certeza de que Ele parará, voltará e olhará para as necessidades humanas. Se a Igreja o buscar, Ele se deixará achar, pois quer curar as feridas que machucam. Os homens podem ser tocados por Cristo, ainda que não mereçam.
Esse é o princípio básico da adoração bíblica e os sentidos humanos na Escritura Sagrada.
Rev. Ângelo Vieira da Silva
Texto baseado no Livro “Adoração Bíblica”
PARA PENSAR:
“Adorar é avivar a consciência através da santidade de Deus, alimentar a mente com a verdade de Deus, purificar a imaginação com a beleza de Deus, abrir o coração ao amor de Deus e render a vontade aos propósitos de Deus” (Willian Temple, ex-arcebispo anglicano).