UM SIGNIFICADO DE ADORAÇÃO


Das muitas passagens bíblicas que nos ensinam sobre a importância da adoração, algumas destacarei aqui. Um texto essencial é Deuteronômio 6.5: “Amarás, pois, o SENHOR, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de toda a tua força”. Entendamos:

A palavra “todo” é importante para a compreensão desse texto bíblico. Ela traduz os conceitos de “completo”, “integral”, “totalidade”. Outrossim, as palavras-chaves do texto são: “coração”, “alma” e “força”. Veja que lição preciosa há nesse estudo de palavras:

1) CORAÇÃO: para o judeu é a sede da mente e da vontade.

2) ALMA: para o judeu é a fonte de vida.

3) FORÇAS:  ênfase; o corpo físico desenvolver sua força de ação.

Agora, é possível definirmos o que seja adoração. Adorar é a entrega COMPLETA de um CORAÇÃO, com INTEGRALIDADE de ALMA e com a TOTALIDADE de FORÇAS.

Temos nas três palavras acima o entendimento de que nossa adoração partirá de aspectos da mente, do espírito e da atitude. A adoração é significativa para o cristão porque Deus atua no ser humano por completo. Não há verdadeira adoração em um ou outro extremo. Há adoração quando esta é feita integralmente, isto é, com toda nosso coração, alma e força. Nesse sentido, cada vez que adoramos, declaramos nosso amor a Deus em reação ao amor com que ele nos amou. É simples, se nós o amamos, é porque ele nos amou primeiro (1 Jo 4.19).

Um outro texto fundamental nesse tema é Hebreus 13.15: “Por meio de Jesus, pois, ofereçamos a Deus, sempre, sacrifício de louvor, que é o fruto de lábios que confessam o seu nome”. Vemos aqui que Jesus é o meio pela qual nos achegamos a Deus. Só podemos adorar a Deus por causa de Jesus e mediante o Senhor. Ele é o nosso sacerdote; é aquele que se ofereceu uma vez por todas para que nós pudéssemos nos apresentar continuamente a Deus com louvores e celebração.

A expressão “fruto de lábios” remonta a Oséias 14.2. Ora, a adoração só pode acontecer significativamente se arrependermos de nossos pecados e vivermos uma vida santa diante de Deus. Mas, por que? É simples! Nossa vida, TODA, deve ser um cântico de adoração expresso em palavras e ações que agradam ao Senhor como um sacrifício vivo. Portanto, podemos perceber que o significado da adoração está:

1) NO SEU AUTOR: que é Deus.

2) NO SEU MODELO: que é de Deus.

3) NO SEU MOTIVO: que é Deus.

A adoração começa e se processa em Deus. Nunca se findará, pois Deus não "se acaba", não morre. A adoração é uma declaração eterna, uma reação eterna ao que Deus fez em nós e por nós. ao que parece,  era assim que Willian Booth, do Exercito da Salvação, acreditava: “Deus tem recebido toda a adoração do meu coração, todo o poder da minha vontade e toda influência da minha vida”.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

GENEROSIDADE, O DOM INEFÁVEL


“Graças a Deus pelo seu dom inefável!” (2 Co 9.15).

A grande pergunta é: qual é o dom inefável de Deus da qual Paulo trata em 2 Coríntios 9.15? Voltemos ao contexto e busquemos a resposta. Ora, em 2 Coríntios 8.9 o apóstolo pensa na liberalidade graciosa do Senhor para com os homens. Ele diz: “pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos”. Essa verdade, tal presente, esse dom, realmente é inefável, é indizível.

Em resposta a generosidade de Deus a Igreja precisa ser semelhantemente generosa. É um desejo profundo de meu coração que a mesma disposição reconhecida no apóstolo Paulo, quanto ao que ele experimentou junto à igreja de Corinto, esteja sobre nós também, a maravilhosa assistência a favor dos santos; afinal, nas palavras do apóstolo dos gentios, era desnecessário escrever acerca deste princípio aos coríntios, pois praticavam tal liberalidade. Logo, Paulo reconhecia a presteza e zelo daqueles irmãos que estimulavam muitíssimos outros (2 Co 9.1-3). Mas, e nós? [...]

Diante disso, recomendou aos irmãos de Corinto que preparassem de antemão uma dádiva já anunciada (como uma oferta do amor), como expressão de generosidade e não de avareza (2 Co 9.5). É o que deveríamos fazer sempre! Agora, nesta sucinta reflexão, pergunto: por que é importante tal atitude no meio do corpo de Cristo?

1) PORQUE TRARÁ PROSPERIDADE SANTA.

Em nossos dias se fala muito em prosperidade dos crentes. Ela existe, se contemplada dentro da esfera da vontade de Deus. Contudo, temos visto muitos exageros. Não creio em uma prosperidade de teor triunfalista sobre toda a Igreja de Cristo, como se fosse esse seu "direito" adquirido. A prosperidade que Paulo fala é santa, pois vem da vontade de Deus para nós. O apóstolo diz que aquele que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia com fartura com abundância também ceifará. A verdade? É Deus quem pode fazer-nos abundar em toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência, superabundemos em toda boa obra. Pense um pouco... Como temos agido? Temos semeado muito ou pouco? Ora, Deus suprirá, aumentará e multiplicará a nossa sementeira, os frutos da nossa justiça, enriquecendo-nos, em tudo, para toda generosidade, a qual faz que, por nosso intermédio, sejam tributadas graças ao Senhor.

2) PORQUE DEUS AMA QUEM DÁ COM ALEGRIA.

Devemos contribuir segundo tiver proposto em nosso coração. Mas, o que há dentro e proposto nele? Se for o mesmo sentimento de Cristo, não daremos com tristeza ou por necessidade, mas porque sabemos que Deus ama a quem dá com alegria.

3) PORQUE REDUNDA EM MUITAS GRAÇAS.

Segundo o apóstolo Paulo o serviço da assistência social não só supre a necessidade dos santos, mas também redunda em muitas graças a Deus, pois as pessoas glorificam a Deus pela nossa obediência ao evangelho de Cristo e pela liberalidade com que contribuímos. Em outras palavras, doar é um ato de testemunho cristão.

Esse é o dom inefável de Deus. Contribua com sua oferta de amor!

Rev. Ângelo Vieira da Silva

THANKSGIVING DAY E BLACK FRIDAY


Se existem datas "tipicamente" americanas que foram importadas para o Brasil, sem muito êxito, são o Thanksgiving Day (Dia de Ações de Graças) e o Black Friday (Sexta Negra). Digo isso porque as aspirações brasileiras em torno dessas datas não chegam perto da realização dos seus criadores. Porém, como fui questionado sobre ambas as datas, gostaria de refletir sobre o antagonismo que percebo entre elas,  principalmente no contexto cristão protestante.

O Black Friday é a expressão americana para descontos no varejo. Para mim, nada tem a ver com doutrinas espiritualistas afro-brasileiras, como li recentemente na internet. O Black Friday é puro merchandising, é markentig, é a sexta-feira da quarta semana de novembro em todos os anos. Segundo dados do site oficial brasileiro, o Black Friday tem reunido centenas de lojas virtuais (e crescendo), cada uma anunciando ofertas que poderiam chegar a 75%. Em relação ao ano passado, houve um expressivo aumento de consumo das vendas. Recorde após recorde. Bilhões e mais bilhões de reais.


Grandemente celebrando nos Estados Unidos e Canadá, o Thanksgiving Day (ou Dia de Ação de Graças) é um feriado cristão em gratidão a Deus pelos acontecimentos durante o ano. A história do costume permeia o século XVII, com a imigração de puritanos (protestantes ingleses) para o Novo Mundo. O "Mayflower" levava a bordo muitas famílias que fugiam da perseguição religiosa em busca de liberdade. Os protestantes das 13 colônias fundadas, apesar das adversidades, mantiveram sua fé em Deus; e o Senhor os abençoou. No outono de 1621, tiveram uma colheita tão abençoada quanto abundante. Emocionados e sinceramente agradecidos, reuniram os melhores frutos, e convidaram os índios, para juntos celebrarem uma grande festa de louvor e gratidão a Deus. Nascia o "Thanksgiving Day". No Brasil, inspirados pelo dia norte-americano, desde o Presidente Dutra e a Lei 781, passando pelo Marechal Castelo Branco (1966), o Dia Nacional de Ação de Graças está instituído na quarta quinta-feira de novembro em todos os anos, apesar de uma intensidade diferente.

Definido os termos, reflito: as datas de ambos acontecimentos são próximas, sendo que uma precede a outra; uma fala de consumo, a outra de produção; uma denota desconto a outra profusão; uma estabelece a compra exagerada e a outra a simplicidade da gratidão. Calma! Não sou contra nem uma, nem outra... Só reflito no antagonismo destas realidades. A oposição de idéias é clara. 

Gostaria apenas que os leitores do blog Regulae Fidei refletissem sobre os perigos do consumismo desenfreado tão proeminente que é celebrado após o Dia de Ação de Graças. Marketing perigoso. Reflitam sobre a insignificância da comemoração de gratidão em nosso país cristão... Omissão perigosa.

Enfim, a grande verdade é que, para muitos (incluindo cristãos protestantes) o sincero Thanksgiving Day é seu Black Friday bem sucedido. Nesse ponto, não há antagonismo, é mero secularismo.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

VOU A UM SHOW GOSPEL. E AGORA?


A comunidade evangélica tem muito se animado na participação dos chamados "shows gospel". Nas cidades de interior, por exemplo, é muito comum a participação de artistas evangélicos na comemoração do Dia do Evangélico. Como a grande maioria dos cristãos, creio ser esse tipo de festa uma oportunidade ímpar de demonstrar o quanto as igrejas da cidade vivem uma espiritualidade profunda e sadia, estando totalmente empenhadas em anunciar o Evangelho transformador de Jesus e testemunhar coerentemente com a adoração e os esperados gestos de um legítimo cidadão.

Pois bem, não será tão simples assim. Há uma notória distorção da essência de "ser Igreja" em nossos tempos. Muitos cristãos deformam o sentido das palavras de Paulo: "considerando cada um os outros superiores a si mesmo" (Fp 2.3), criando uma aberração evangélica: "os fãs gospel". Particularmente, creio que o movimento gospel enaltece muitos simples irmãos e ministérios ao status de celebridades e dos shows. Assim, embora devessem ser encontrados discípulos de Cristo nesse meio, são os fãs que surgem aos milhares, "idolatrando ídolos" que são tão pecadores quanto qualquer outro cristão. Fãs não são Discípulos, e vice-versa.

Tenho minhas considerações pessoais quanto a muitos artistas do meio gospel. A despeito disso, não contrario ninguém que participa desses shows. Eu mesmo já participei de muitos, principalmente quando era mais jovem. Sei que é possível adorar a Deus nesses eventos, mesmo que apresentem algumas manchas. Porém, me preocupo com cristãos menos amadurecidos na fé, que nem mesmo percebem suas ações e reações diante de seu "ídolo", muitas vezes beirando ao pecado e até mesmo ao ridículo. Portanto, para todos nós que poderemos participar de um evento como esse, presto-me a oferecer oito orientações sobre como se portar. Vejamos:

1) Entenda que o motivo principal do evento é a glória de Deus.

Fundamentalmente, o que nos move é a promoção daquele que é Digno de receber a glória, a honra e o poder pelos séculos dos séculos (Ap 4.11). Amém. Convém que Ele cresça e que nós diminuamos (Jo 3.30).

2) Saiba que os irmãos artistas são tão especiais quanto você.

Deus conferiu dons extraordinários para os irmãos artistas. Igualmente, o Espírito Santo distribui os mesmos dons à Igreja de Cristo, nos cristãos individualmente, como lhe apraz (1 Co 12.11). O Senhor deles é o Senhor nosso.

3) Evite "tietar" a outrem, enaltecendo homens comuns ao invés de Jesus.

Se algum homem se promove, incorre em vanglória que, por sua vez, frutifica a inveja (Gl 5.26, 21). O discípulo de Cristo segue o exemplo de seu Mestre (Mt 11.29).

4) Reflita sobre sua vida espiritual e se aproxime mais de Deus.

O progresso espiritual está estritamente ligado à reflexão e diligência (I Tm 4.15).

5) Adore a Deus com as canções e ouça atentamente a pregação das Sagradas Escrituras.

Só a Pregação da Palavra de Deus converte o pecador. Os convertidos louvam ao Senhor e se alimentam da Bíblia (Rm 10.14, 17; Rm 1.16; Lc 16.29-31; 1 Co 1.18). Nada a substitui, nem o louvor.

6) Fuja de tumultos e discórdias, promovendo a união nos vínculos do Espírito.

Nem tudo é perfeito nas Igrejas; muito menos em eventos como esse. Por isso, esforcemo-nos por preservar a unidade (Ef 4.3), amando uns aos outros, pois aí está o vínculo da perfeição (Cl 3.14).

7) Anuncie Jesus para uma pessoa, pelo menos.

Esteja preparado para falar daquele que transformou sua vida, dando-lhe uma esperança eterna e insubstituível (1 Pe 3.15).

8) Medite em tudo, pois aqueles que não estiverem salvos diante do Trono de Deus, estarão perdidos diante do Seu Tribunal. É o que importa no final (2 Co 5.10).

Em Cristo Jesus, Senhor nosso,
Rev. Ângelo Vieira da Silva

FILME “NOÉ”


É possível que o leitor já tenha assistido o polêmico filme "Noé" (do original inglês "Noah", 2014). O afamado Russell Crowe (Noé) protagonizou o drama de 138 minutos que arrecadou mais de trezentos milhões de dólares como faturamento. O filme conta ainda com Jennifer Connelly (Naameh, esposa de Noé), Douglas Booth (Sem), Logam Lerman (Cam), Leo McHugh Carroll (Jafé), Emma Watson (Ila), Anthony Hopkins (Matusalém), Kevin Durand (um dos Gigantes) e Dakota Goyo (jovem Noé), dentre outros.

Vi o Filme e li diversos comentários do diretor e atores envolvidos. Diante disso, exponho abaixo o que não se deve esperar do filme "Noé", principalmente se se é cristão comprometido com a Bíblia como a Palavra de Deus. Vejamos:

1) Não espere um filme fiel a Bíblia, mas ao roteiro.

Em "Noé", o contexto bíblico de poucos capítulos será apenas um detalhe. Obviamente, o roteiro será recheado da visão pessoal, artística e sombria* do diretor estadunidense (Darren Aronofsky) e, provavelmente, englobará "outras" perspectivas literárias, tal como a visão mítica do pseudoepígrafo 1 Enoque (ou Enoque etíope) acerca de Gênesis 6.**

2) Não espere um filme espiritual, mas "humanizado".

Isso é, de acordo com a visão particular de um ou mais homens sem preocupação com "a verdade espiritual". Por mais elementos bíblicos que possa utilizar, o filme estará distante da mensagem espiritual descrita nas Sagradas Escrituras. Gênesis 6.8-9, por exemplo, revela que Noé achou graça diante de Deus. Ele era justo e íntegro entre os seus contemporâneos. Noé andava com Deus. Por outro lado, a produção evoca um Noé repreensível, não tão íntegro entre os seus. Semelhantemente, há discrepâncias envolvendo a arca, os animais, a família de Noé, os Nefilins e outras tantas.

Ao fim, o cristão perguntará: devo assistir o filme? Essa é uma decisão pessoal. Não creio que o filme diminua nem aumente a fé de um cristão comprometido com as Escrituras. O filme é um mero filme e, como tal, ao ser visto, deve ser criticado pelos espectadores. Como qualquer outra produção que envolve situações que contrariam princípios bíblicos (envolvendo assassinatos ou outras cosmovisões religiosas, por exemplo), o cristão amadurecido é aquele que sabe separar o certo do errado, a verdade da mentira, o bíblico do fictício, a realidade do filme, Noé do "Noé".

Rev. Ângelo Vieira da Silva

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* Sugiro o filme "Cisne Negro" (do original inglês "Black Swan") para a percepção dessa visão sombria.

** O que pode fundamentar a presença dos "gigantes de pedra" que, no filme, ajudam Noé a construir a arca.

TRAILER:




BEM-AVENTURADOS OS PERSEGUIDOS


“Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. 11 Bem-aventurados sois quando, por minha causa, vos injuriarem, e vos perseguirem, e, mentindo, disserem todo mal contra vós. 12 Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus; pois assim perseguiram aos profetas que viveram antes de vós” (Mt 5.10-12; Lc 6.22-23)


Os versículos selecionados nos Evangelhos de Mateus e Lucas apresentam o cristão como alvo de assegurada perseguição. Naturalmente, uma leitura breve dessa passagem pode induzir a crença que qualquer tipo de perseguição esteja em seu foco; ou, se referindo apenas aos líderes perseguidos, os profetas. Não é salutar essa interpretação. O texto também não é direcionado aos perseguidos políticos, pela cor, pelo gênero, dentre outros. Não se fala aqui de qualquer tipo de sofrimento, mas de uma perseguição religiosa. A perseguição se dá por causa de Cristo: “sereis odiados de todos por causa do meu nome; aquele, porém, que perseverar até ao fim, esse será salvo” (Mc 13.13). Esse é o foco da bem-aventurança.

Então, o que essa bem-aventurança ensina precisamente? Vejamos as palavras usadas por nosso Senhor: “perseguidos/perseguirem/perseguiram” (dioko, gr.) é uma atitude de “hostilidade”, aquele que é contrário, provocador; “injuriarem” (oneidizo, gr.), repetido duas vezes, refere-se a “maus-tratos”, o que, em nossa legislação, inclusive, é crime; “mentindo” (pseudomai, gr.) é o mesmo que “falar falsidades”; “o disserem todo mal” (poneros, gr.) amplia a perseguição, pois fala de “uma natureza má”; “odiarem” (miseo, gr.) e “detestar” são sinônimos. Eis uma experiência de ódio e abominação; “expulsarem da sua companhia” (aphorizo, gr.) é o mesmo que “impor limites por má reputação”. Daí o sentido de “rejeitarem” (ekballo, gr.), “expulsar ou expelir”. Enfim, todas essas palavras expressam uma resoluta verdade: a perseguição à Igreja fiel é dura. A Igreja será odiada por seu amor a Jesus: “Basta ao discípulo ser como o seu mestre, e ao servo, como o seu senhor. Se chamaram Belzebu ao dono da casa, quanto mais aos seus domésticos?”... “Infiéis, não compreendeis que a amizade do mundo é inimiga de Deus? Aquele, pois, que quiser ser amigo do mundo constitui-se inimigo de Deus” (Mt 10.25; Tg 4.4).

Além disso, Jesus declarou que seus discípulos são perseguidos “por causa da justiça”, “por minha causa”, “por causa do Filho do Homem”. O motivo é a fé em Jesus Cristo. Como expressou o discípulo amado, “irmãos, não vos maravilheis se o mundo vos odeia” (1 Jo 3.13), “se o mundo vos odeia, sabei que, primeiro do que a vós outros, me odiou a mim. Se vós fôsseis do mundo, o mundo amaria o que era seu; como, todavia, não sois do mundo, pelo contrário, dele vos escolhi, por isso, o mundo vos odeia. Lembrai-vos da palavra que eu vos disse: não é o servo maior do que seu senhor. Se me perseguiram a mim, também perseguirão a vós outros; se guardaram a minha palavra, também guardarão a vossa. Tudo isto, porém, vos farão por causa do meu nome, porquanto não conhecem aquele que me enviou. Se eu não viera, nem lhes houvera falado, pecado não teriam; mas, agora, não têm desculpa do seu pecado. Quem me odeia odeia também a meu Pai. Se eu não tivesse feito entre eles tais obras, quais nenhum outro fez, pecado não teriam; mas, agora, não somente têm eles visto, mas também odiado, tanto a mim como a meu Pai. Isto, porém, é para que se cumpra a palavra escrita na sua lei: Odiaram-me sem motivo” (Jo 15.18-25). Assim, essa bem-aventurança ensina que são extremamente felizes os cristãos que desenvolvem uma fé genuína em Jesus Cristo e que, por causa dele, são perseguidos por sustentarem os padrões divinos pela Palavra. Independente das situações, os perseguidos se mantêm firmes e fiéis ao seu Senhor (Sl 73.26).

Finalmente, pergunto: qual é a promessa dessa bem-aventurança? Duas expressões definem a promessa: “porque deles é o Reino dos céus” e “é grande o vosso galardão nos céus”. São frases sinônimas, pois a promessa é o grande galardão do Reino dos céus (Rm 8.18; 1 Pe 1.3-4). Portanto, encerro o texto da sétima bem-aventurança lembrando uma citação do apologista Tertuliano de Cartago, província romana na África (160-225 d.C.): “Não é o sofrimento, mas a causa do sofrimento que faz o mártir”.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

OS SERES ANGELICAIS


Deus criou duas classes de seres pessoais: uma é o gênero humano, a outra são os anjos. A palavra anjo vem do grego “angelós” e significa mensageiro, aquele que é enviado. Na Bíblia, Miguel e Gabriel se destacam. O primeiro é, na verdade, chefe dos anjos, significado do termo arcanjo, que acompanha seu nome (Jd 1.9); o segundo é o anjo que assiste diante de Deus e que serve de elo das revelações divinas (Lc 1.19). Há, ainda, os serafins (que permanecem diante do trono servindo e cantando louvores a Deus) e os querubins (que guardam a entrada do paraíso) conforme os textos de Isaías 6.2, 6, e Gênesis 3.24. As Escrituras também descrevem os principados, potestades, tronos e domínios que não são diferentes tipos de anjos, mas diversas classes angelicais. Os anjos são numerosos e poderosos (Mt 26.53, Ap 5.11).

Os anjos são agentes sobrenaturais. Podem mover-se de um ponto para outro qualquer e até mesmo congregar-se em áreas diminutas, por exemplo (Lc 8.30). Eles são seres morais (seguem um padrão de conduta), inteligentes (têm compreensão e percepção das realidades espirituais e humanas) e espirituais (ou seja, não possuem corpo físico, embora possam se revelar na forma física humana, conforme Gn 18.2-19.22, Jo 20.10-14, At 12.7-10). É correto afirmar que os anjos não se casam (Mt 22.30) e que não estão sujeitos à morte (Lc 20.35-36). Também é correto entender que, assim como Adão e Eva foram postos à prova no Éden, assim também os anjos o foram em algum tempo não revelado na Bíblia, subdividindo a classe angelical em anjos reprovados/caídos e anjos aprovados/eleitos.

Os anjos estão no céu. Ali, em santidade e glória, trabalham e adoram ao Senhor, Rei dos reis e Senhor dos senhores (Mt 18.10, Mt 22.30, Ap 5.11, Sl 103.20-21, Sl 148.2). Mas os anjos foram criados apenas para trabalhar e adorar ao Senhor? A resposta é não. Os anjos possuem também o ministério de prestar serviço aos cristãos, à Igreja, por ordem do Senhor (Hb 1.14, 1 Co 10.11). Pensemos na divisão colocada no parágrafo anterior... Os anjos eleitos servem a Deus e à Igreja; os anjos reprovados ou caídos servem ao diabo para “destruir” à Igreja. Nesse sentido, os anjos eleitos existem para guardar os crentes, tanto grandes como pequenos (Sl 34.7, 1 Pe 1.12, Mt 18.10) o que não implica na crença de que temos um anjo da guarda conforme a filosofia astral, mas sim que os anjos, e principalmente, o Anjo do Senhor, está pronto a nos socorrer sobre a ordem de Deus. Até mesmo na morte dos cristãos os anjos possuem atos de um belo ministério recebido por Deus (Lc 16.22).

Está implícito nas Escrituras que os anjos possuem uma maior instrução sobre as coisas espirituais do que os humanos. É por isso que não devemos subestimar o inimigo de nossas almas, o anjo caído, Satanás. Contudo sempre prevalecerá o ensinamento bíblico: da parte dos anjos, dos homens e de qualquer outra criatura, a Deus são devidos todo culto, serviço e obediência, que ele houve por bem requerer deles.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

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Leia mais sobre anjos aqui no Blog Regulae Fidei, clicando aqui.

BEM-AVENTURADOS OS PACIFICADORES


“Bem-aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus” (Mt 5.9).

É impossível que essa bem-aventurança esteja confirmando que o mundo caminhará até a paz mundial ou ausência total de guerras. Também não é possível que denote apenas um sentimento ou estado passivo de paz. Veja: as Sagradas Escrituras demonstram que o mundo não caminhará para paz mundial, mas para o aumento crescente da iniquidade (Mt 24.3-12): “No monte das Oliveiras, achava-se Jesus assentado, quando se aproximaram dele os discípulos, em particular, e lhe pediram: Dize-nos quando sucederão estas coisas e que sinal haverá da tua vinda e da consumação do século. E ele lhes respondeu: Vede que ninguém vos engane. Porque virão muitos em meu nome, dizendo: Eu sou o Cristo, e enganarão a muitos. E, certamente, ouvireis falar de guerras e rumores de guerras; vede, não vos assusteis, porque é necessário assim acontecer, mas ainda não é o fim. Porquanto se levantará nação contra nação, reino contra reino, e haverá fomes e terremotos em vários lugares; porém tudo isto é o princípio das dores. Então, sereis atribulados, e vos matarão. Sereis odiados de todas as nações, por causa do meu nome. Nesse tempo, muitos hão de se escandalizar, trair e odiar uns aos outros; levantar-se-ão muitos falsos profetas e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos”. 

Pacificadores” (eirenopoios, gr.), remete ao “fazer algo superior” para se alcançar “segurança e harmonia”. Isso é paz ou pacificar. É o que se deseja com o cumprimento judaico “shalom”, por exemplo. Portanto, parafraseando o comentarista bíblico Simon Kistemaker, a sétima bem-aventurança ensina que são extremamente felizes os cristãos que servem ao Deus da Paz (1 Co 14.33; 1 Ts 5.23), que aspiram viver a paz com todos os homens (Rm 12.17-18), proclamam o evangelho da paz (Ef 6.15; Is 52.7) e modelam suas vidas como a do Príncipe da Paz (Jo 13.15; Is 9.6-7). A verdadeira segurança e harmonia são alcançadas com o Supremo Bem. Daí a mensagem de reconciliação (2 Co 5.20): “De sorte que somos embaixadores em nome de Cristo, como se Deus exortasse por nosso intermédio. Em nome de Cristo, pois, rogamos que vos reconcilieis com Deus”.

Mas, qual é a promessa dessa bem-aventurança? Ora, os pacificadores serão chamados filhos de Deus: “vede que grande amor nos tem concedido o Pai, a ponto de sermos chamados filhos de Deus; e, de fato, somos filhos de Deus. Por essa razão, o mundo não nos conhece, porquanto não o conheceu a ele mesmo” (1 Jo 3.1). Eis uma palavra de reconhecimento, como da Igreja Primitiva chamada de “cristãos” (At 11.26). Historicamente, “ser filho de” é o mesmo que “ter a natureza de”. Assim, os cristãos são reconhecidos por seus valores e atitudes aliadas ao Cristo do Deus de paz. A paz é um fruto do Espírito (Gl 5.22). Ora, o pacificador não é aquele que apenas recebe a paz e a conserva diante dos momentos difíceis da vida. É uma atitude, uma conduta ativa. O pacificador é aquele que promove a paz, não meramente que a sente, a ama ou a deseja: “Segui a paz com todos e a santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor”... “A sabedoria, porém, lá do alto é, primeiramente, pura; depois, pacífica, indulgente, tratável, plena de misericórdia e de bons frutos, imparcial, sem fingimento. 18 Ora, é em paz que se semeia o fruto da justiça, para os que promovem a paz” (Hb 12.14; Tg 3.17-18).

Encerro o texto sobre a sétima bem-aventurança lembrando uma frase do Rev. Augustus Nicodemos Lopes, doutor em interpretação bíblica e vice-presidente do Supremo Concílio da Igreja Presbiteriana do Brasil: “Deus não prometeu uma viagem tranquila, apenas uma chegada segura”.

Pense nisso.
Rev. Ângelo Vieira da Silva

OS DIÁCONOS DA IGREJA DE JESUS

“Pois os que desempenharem bem o diaconato alcançam para si mesmos justa preeminência e muita intrepidez na fé em Cristo Jesus” (1 Tm 3.13)

A palavra “diácono” (diakonia, gr.) pode ser traduzida por “serviço, contribuição, missão”. O diaconato é um ministério gracioso (Rm 12.7) que o Senhor instituiu na era apostólica. Para que os diáconos possam desempenhar seu papel de forma correta é necessário que a igreja os eleja sob a vontade de Deus, compreendo essencialmente que:

1) SER DIÁCONO SIGNIFICA SERVIR.

Uma das traduções da palavra diakonia é serviço. É muito difícil encontrarmos servos segundo Mateus 20.26: “Não é assim entre vós; pelo contrário, quem quiser tornar-se grande entre vós, será esse o que vos sirva”. Entretanto, essa é uma exigência e uma razão de ser do diácono. Os apóstolos tinham o ministério arraigado no dedicar-se à Palavra e à oração. Eles não podiam mais cuidar diretamente da distribuição diária. Assim, iluminados pelo Espírito Santo do Senhor, conclamaram a igreja para que elegesse homens que se encarregassem do serviço da distribuição diária das viúvas que estavam sendo esquecidas (At 6.1-4), homens para servir. Lembre-se: Um verdadeiro diácono não serve porque é diácono, mas é diácono justamente porque serve.

2. SER DIÁCONO SIGNIFICA CONTRIBUIR.

Mais uma tradução da palavra diakonia pode ser lembrada: como distribuição ou contribuição. O diácono não contribui apenas para causas sociais ou para o bom andamento do culto; ele contribui para o crescimento do Reino de Deus com sua boa reputação (At 6.3). Parece haver um jogo de palavras: o diácono distribui em seu ministério e contribui com esse mesmo ministério para a propagação do evangelho. Segundo 1 Tm 3:8-10, os diáconos devem contribuir sendo respeitáveis, de uma só palavra, não inclinados a muito vinho, não cobiçosos de sórdida ganância, conservando o mistério da fé com a consciência limpa. Lembre-se: Um verdadeiro diácono não contribui porque é diácono, mas é diácono justamente porque contribui.

3. SER UM DIÁCONO SIGNIFICA TER UMA MISSÃO.

Diakonia pode ser traduzida como missão. Mas, qual será a missão do diácono? Manter a ordem no templo? Cuidar para que as crianças não fiquem sempre perambulando durante o culto? Levar um copo de água para o Pastor? Não é apenas isso... Sim, ser diácono é ter uma missão; principalmente, a missão de ajudar ao necessitado, ao pobre, à viúva, ao debilitado. É a missão do socorro, da misericórdia. Os diáconos devem amar os que muitas vezes são odiados e socorrê-los. Portanto, o diácono se dispõe e cria a mesma disposição Dessa missão no coração da Igreja do Senhor. Sendo assim, ele será um obreiro aprovado (2 Tm 2.15). Assim, um verdadeiro diácono não ama porque é diácono, mas é diácono justamente porque ama e está sempre pronto a cumprir sua missão de socorro.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

ANCIÃOS E PRESBÍTEROS: OS PASTORES DO REBANHO DE DEUS


“Fiel é a Palavra: se alguém aspira ao episcopado, excelente obra almeja” (1 Tm 3.1). Sim, a aspiração da qual o apóstolo Paulo se refere aponta para aqueles que são chamados para liderar a Igreja de Deus. Seja qual for o nome (episcopado, bispo, mestre, ministro, presbítero, ancião, anjo da Igreja, embaixador, evangelista, pregador, doutor, despenseiro dos mistérios de Deus, dentre outros), as Sagradas Escrituras descrevem as qualificações e funções daqueles que são os verdadeiros pastores do rebanho de Deus. Tais títulos não descrevem graus diferentes de dignidade, mas as funções honrosas dos que são chamados para cuidar, ensinar, administrar, supervisionar e amar a Igreja de Jesus.

O jovem pastor Timóteo foi instruído por Paulo sobre as qualificações indispensáveis para aqueles que almejavam o ‘‘episcopado’’, o mesmo que ‘‘ser bispos’’ (1 Tm 3.2; Tt 1.7; 1 Pe 2.25) ou ‘‘presbíteros’’ ─ esse último percebido na maioria dos textos que tratam do assunto no Novo Testamento (At 11.30; At 14.23; At 15.2, 4, 6, 22-23; At 16.4; At 20.17; At 21.18; 1 Tm 5.17, 19; Tt 1.5; Tg 5.14; 1 Pe 5.1; 2 Jo 1.1; 3 Jo 1.1). Ora, tal ofício é uma excelente obra que todos os homens da Igreja deveriam almejar.

O texto hebraico e grego, o Antigo e o Novo Testamentos, esclarecem as atribuições dos pastores do rebanho de Deus. Ora, o neo-testamentário ‘‘presbítero’’ (presbyterós, gr.) é o vétero-testamentário ‘‘ancião’’ (zaqen, heb.). Ambas as palavras designam um ofício de liderança. Não que todo líder tenha que ser idoso, pois os termos também são usados para os líderes sem referência à sua idade, mas que é necessário que sejam experientes e experimentados, exemplos para todos. Por isso, abaixo faço um breve panorama do pastoreio do rebanho de Deus sob a perspectiva do ancião.

1) O ANCIÃO NO ANTIGO TESTAMENTO.

A liderança através de um concílio de homens chamados “anciãos” era muito familiar aos judeus, afinal, era uma das instituições mais antigas e fundamentais de Israel, remontando ao cativeiro egípcio (Ex 3.16, 18). Os anciãos eram os representantes oficiais do povo, chamados de “anciãos de Israel”, “anciãos dos filhos de Israel” ou “anciãos do povo”. Sendo mencionados centenas de vezes no Antigo Testamento, tinham o papel fundamental de liderar, o que fica evidente em sua participação ativa em cada evento decisivo da história de Israel. Deus reconheceu o papel de liderança dos anciãos enviando Moisés primeiramente a eles para anunciar a libertação do cativeiro (Ex 3.16,18; Ex 4.29; Ex 12.21; Ex 17.5-6; Ex 18.12; Ex 19.7; Ex 24.1, 9, 14; dentre outros).

2) O ANCIÃO NO NOVO TESTAMENTO.

No Novo Testamento os anciãos são chamados de presbíteros. À luz do livro de Atos dos Apóstolos e das cartas, vemos que os presbíteros são os representantes oficiais da Igreja com autoridade semelhante ao dos apóstolos. Eles recebem e administram recursos materiais (At 11.29-30), julgam questões doutrinárias (At 15.1-29), oferecem conselho e resolvem conflitos (At 21.18-25). Lendo-se as muitas passagens bíblicas que envolvem os presbíteros fica evidente que os mesmos foram colocados à frente da Igreja pelo próprio Deus, com a tarefa de supervisionar o povo e, assim, cumprir o mandamento de ‘‘pastorear o rebanho de Deus’’ (1 Pe 5.1-4).

Portanto, os presbíteros são os verdadeiros pastores da Igreja. Devemos orar por eles antes, durante e depois das eleições/ordenação/investiduras. Apesar de ser uma obra excelente, é repleta de sofrimentos que podem ser resumidos nas palavras de Jesus: ‘‘o Filho do Homem não tem onde reclinar a cabeça’’ (Mc 8.20). Por isso, ore e creia: ‘‘Dar-vos-ei pastores segundo o meu coração, que vos apascentem com conhecimento e com inteligência’’ (Jr 3.15).

Rev. Ângelo Vieira da Silva

BEM AVENTURADOS OS LIMPOS DE CORAÇÃO


“Bem-aventurados os limpos de coração, porque verão a Deus” (Mt 5.8).

Essencialmente, a sexta bem-aventurança não expressa um coração limpo mediante uma limpeza exterior, como muitos podem achar. Ora, é possível que a religião ofereça a possibilidade de uma limpeza exterior do coração, tal como o farisaísmo do Novo Testamento: “Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque limpais o exterior do copo e do prato, mas estes, por dentro, estão cheios de rapina e intemperança! Fariseu cego, limpa primeiro o interior do copo, para que também o seu exterior fique limpo! Ai de vós, escribas e fariseus, hipócritas, porque sois semelhantes aos sepulcros caiados, que, por fora, se mostram belos, mas interiormente estão cheios de ossos de mortos e de toda imundícia! Assim também vós exteriormente pareceis justos aos homens, mas, por dentro, estais cheios de hipocrisia e de iniquidade”... “Abominável é ao SENHOR todo arrogante de coração; é evidente que não ficará impune” (Mt 23.25-28; Pv 16.5). Jesus, porém, fala do coração, sede da vontade e caráter (pensar, sentir, querer). Ao contrário dessa perigosa interpretação, o Senhor fala de uma limpeza interior do enganoso coração: “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá?” (Jr 17.9). O exterior precisa ser uma revelação do interior.

O termo “limpo” (katharos, gr.) refere-se à “liberdade, aquilo que não possui qualquer mistura”. Na perspectiva judaica, o coração é a sede da “vontade e caráter”: “Bem sei, meu Deus, que tu provas os corações e que da sinceridade te agradas; eu também, na sinceridade de meu coração, dei voluntariamente todas estas coisas; acabo de ver com alegria que o teu povo, que se acha aqui, te faz ofertas voluntariamente. SENHOR, Deus de nossos pais Abraão, Isaque e Israel, conserva para sempre no coração do teu povo estas disposições e pensamentos, inclina-lhe o coração para contigo; e a Salomão, meu filho, dá coração íntegro para guardar os teus mandamentos, os teus testemunhos e os teus estatutos, fazendo tudo para edificar este palácio para o qual providenciei” (I Cr 29.17-19). Assim, no sentido espiritual das bem-aventuranças, os limpos de coração serão os “homens livres do pecado, que não se misturam com a iniquidade”: “Chegai-vos a Deus, e ele se chegará a vós outros. Purificai as mãos, pecadores; e vós que sois de ânimo dobre, limpai o coração”... “Tende cuidado, irmãos, jamais aconteça haver em qualquer de vós perverso coração de incredulidade que vos afaste do Deus vivo” (Tg 4.8; Hb 3.12).

Finalmente, pergunto: qual é a promessa dessa bem-aventurança? “Porque verão a Deus’’, responde Jesus. Não verão “literalmente” a Deus (Ex 33.20), mas contemplarão a sua glória em Jesus: “Amados, agora, somos filhos de Deus, e ainda não se manifestou o que haveremos de ser. Sabemos que, quando ele se manifestar, seremos semelhantes a ele, porque haveremos de vê-lo como ele é”...“Quem subirá ao monte do SENHOR? Quem há de permanecer no seu santo lugar? O que é limpo de mãos e puro de coração, que não entrega a sua alma à falsidade, nem jura dolosamente” (1 Jo 3.2; Sl 24.3-4). Verão o Pai no Filho: “Replicou-lhe Filipe: Senhor, mostra-nos o Pai, e isso nos basta. 9 Disse-lhe Jesus: Filipe, há tanto tempo estou convosco, e não me tens conhecido? Quem me vê a mim vê o Pai; como dizes tu: Mostra-nos o Pai?” (Jo 14.8-9). De fato, com efeito, “Deus é bom para com Israel, para com os de coração limpo” (Sl 73.1).

Encerro o estudo da sexta bem-aventurança lembrando um pensamento do afamado cientista Benjamim Franklin, calvinista e um dos líderes da revolução americana: “Limpe seus dedos antes de apontar para minhas manchas”. Parafraseio aqui: que seu coração seja limpo antes de exigir a limpeza de outros corações.

Pense nisso.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

PRINCÍPIOS BÍBLICOS PARA AS OFERTAS VOLUNTÁRIAS


No sentido bíblico-etimológico, a palavra “ofertar” significa “oferecer voluntariamente”, atitude regularmente associada ao ajuntamento solene (Is 1.13). Lembre-se disso: as ofertas não são o dízimo, são somadas a ele e a outros tipos de ofertas: “Nas tuas cidades, não poderás comer o dízimo do teu cereal, nem do teu vinho, nem do teu azeite, nem os primogênitos das tuas vacas, nem das tuas ovelhas, nem nenhuma das tuas ofertas votivas, que houveres prometido, nem as tuas ofertas voluntárias, nem as ofertas das tuas mãos” (Dt 12.17). Em todos os casos não se trata do que se sobra, mas do que é primícia, uma alegre contribuição (2 Co 9.7). Aí está o alerta do Senhor Jesus: “Porque todos eles ofertaram do que lhes sobrava; ela, porém, da sua pobreza deu tudo quanto possuía, todo o seu sustento” (Mc 12.44).

Seja rico ou pobre, homem ou mulher (Ex 30.15; Ex 35.22), Deus nos conclama a ofertar por causas específicas, liberalmente. Devemos ofertar dinheiro (Ex 25.3), principalmente para obras especiais na Casa do Senhor. Exodo 35 mostra como o povo ofertava para obras de construção, por exemplo: “e veio todo homem cujo coração o moveu e cujo espírito o impeliu e trouxe a oferta ao Senhor para a obra da tenda da congregação, e para todo o seu serviço, e para as vestes sagradas... os filhos de Israel trouxeram oferta voluntária ao SENHOR, a saber, todo homem e mulher cujo coração os dispôs para trazerem uma oferta para toda a obra que o Senhor tinha ordenado se fizesse por intermédio de Moisés”. É interessante notarmos que Moisés precisou proibir o povo trazer mais ofertas, pois já estavam sobejando (Ex 36.6). Esdras também viu a voluntariedade da nação: “Alguns dos cabeças de famílias, vindo à Casa do Senhor, a qual está em Jerusalém, deram voluntárias ofertas para a Casa de Deus, para a restaurarem no seu lugar... e, depois disto, traziam ofertas voluntárias ao Senhor... bem assim a prata e o ouro que achares em toda a província da Babilônia, com as ofertas voluntárias do povo e dos sacerdotes, oferecidas, espontaneamente, para a casa de seu Deus, a qual está em Jerusalém... Portanto, diligentemente comprarás com este dinheiro novilhos, e carneiros, e cordeiros, e as suas ofertas de manjares, e as suas libações e as oferecerás sobre o altar da casa de teu Deus, a qual está em Jerusalém” (Ed 2.68; Ed 3.5; Ed 7.16; Ed 7.17).

Devemos ofertar porque é ordem do Senhor (Ex 25.2). Ofertar precisa ser uma disposição voluntária de nosso coração: “Tomai, do que tendes, uma oferta para o SENHOR; cada um, de coração disposto, voluntariamente a trará por oferta ao SENHOR: ouro, prata, bronze”. Precisamos ofertar porque as ofertas, assim como o dízimo, são do Senhor, são sagradas (Ne 18.8, 19). Daí Deus não se agradar de ofertas associadas com iniqüidade, pecados (Is 1.13). São vãs contribuições (Sl 40.6). Se aprendermos esses fundamentos, então, Deus se agradará dos sacrifícios de justiça, dos holocaustos e das ofertas (Sl 51.19). 

Rev. Ângelo Vieira da Silva

BEM AVENTURADOS OS MISERICORDIOSOS


“Bem-aventurados os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia” (Mt 5.7).

A quinta bem-aventurança não é uma menção a qualquer misericórdia humana desassociada de Jesus, ou divina que alcança todos os homens. O homem natural pode ser misericordioso, mas sua filantropia não resulta de uma experiência com Deus (At 28.2; At 27.3). Ora, o Mestre fala da misericórdia que resulta de uma relação espiritual com o Senhor. Igualmente, a Bíblia descreve que Deus é amor, o Pai das misericórdias (2 Co 1.3), e muitos acreditam que a misericórdia divina alcançará todos os homens no fim, no dia do juízo. Bem, “alcançar misericórdia” é obra da graça divina, não das obras humanas: “Pois ele diz a Moisés: Terei misericórdia de quem me aprouver ter misericórdia e compadecer-me-ei de quem me aprouver ter compaixão. Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia... Logo, tem ele misericórdia de quem quer e também endurece a quem lhe apraz”... “Porque o juízo é sem misericórdia para com aquele que não usou de misericórdia. A misericórdia triunfa sobre o juízo” (Rm 9.15-18; Tg 2.13).

Compreenda: o termo “misericordiosos” (eleemon, gr.) remete àquele que “oferece ou busca ajuda em tempo de aflição”. É mais do que “sentir compaixão na miséria do outro”, pois também envolve àquele que “sente sua própria miséria e precisa de compaixão”. São dois lados de um resoluto ato, não meramente um sentimento ou estado. Como bem declarou o comentarista bíblico Ralph Earle, misericórdia é a “bondade em ação”. O Jesus misericordioso nos ama e decidiu provar esse amor por meio de seu sacrifício: “Por isso mesmo, convinha que, em todas as coisas, se tornasse semelhante aos irmãos, para ser misericordioso e fiel sumo sacerdote nas coisas referentes a Deus e para fazer propiciação pelos pecados do povo” (Hb 2.17). Agora, igualmente, os cristãos devem ser misericordiosos uns com os outros (Rm 15.7; Ef 4.32; Cl 3.12) e com o próximo que ainda não conhece o Senhor (Gl 6.10). Desse modo, a quinta bem-aventurança ensina que são extremamente felizes os cristãos que, reconhecendo sua condição de miséria espiritual, recebem o amor de Deus em seu favor e que são, obrigatoriamente, agentes da mesma misericórdia em relação ao próximo, como sinal de gratidão. É por isso que a parábola do credor incompassivo é perfeita para o entendimento da quinta bem-aventurança: “Então, o seu senhor, chamando-o, lhe disse: Servo malvado, perdoei-te aquela dívida toda porque me suplicaste; não devias tu, igualmente, compadecer-te do teu conservo, como também eu me compadeci de ti?” (Mt 18.32-33). Portanto, como a oração do Senhor expressa, “perdoa-nos as nossas dívidas, assim como nós temos perdoado aos nossos devedores... Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará; se, porém, não perdoardes aos homens as suas ofensas, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas” (Mt 6.12, 14-15).

Finalmente, o Senhor ensina que seu discípulo deve exercer a misericórdia; não é uma opção. Nesse sentido, o cristão misericordioso com seu próximo experimentará a misericórdia divina a cada dia. Para com o benigno Deus será benigno (II Sm 22.26) e cumprirá sua promessa. Qual? Ora, “alcançarão misericórdia”, o ciclo da misericórdia se renovará a cada manhã: “As misericórdias do SENHOR são a causa de não sermos consumidos, porque as suas misericórdias não têm fim; renovam-se cada manhã. Grande é a tua fidelidade” (Lm 3.22-23).

Rev. Ângelo Vieira da Silva

UM AUTOEXAME DA VIDA CRISTÃ


O contexto histórico do profeta Jeremias revela que os versos do livro de Lamentações foram escritos após Israel ter sido levado cativo e Jerusalém ter ficado desolada. O profeta assentou, chorou e lamentou por causa do novo e difícil tempo que iniciara na história do povo de Deus.

Na leitura de Lamentações, destaque o terceiro capítulo. Inicia-se o texto com uma chamada à conversão (Lm 3.40-42), fundamentada num autoexame espiritual. O profeta se coloca lado a lado com seus compatriotas e suplica que retornem ao Senhor, buscando a reconciliação com Deus.

Agora, pondere sobre o versículo quarenta. A necessidade de autoexame é expressa por Jeremias mediante as palavras “esquadrinhar” (o mesmo que testar, examinar), “provar” (sentido de examinar detalhadamente) e “voltar” (retornar, no sentido de arrepender-se e mudar de postura). 

Considerando o anúncio profético e a proximidade de um novo ano, será salutar refletir em muitos aspectos da vida espiritual. Convido-lhe a fazer o seguinte autoexame de sua vida cristã:

01. UM AUTOEXAME SOBRE O PERDÃO. Leia Mt 6.12-15 e reflita.

02. UM AUTOEXAME SOBRE AS PRIORIDADES. Observe Mt 6.33 e Lc 18.29-30.

03. UM AUTOEXAME SOBRE O EVANGELISMO. Está cumprindo Mc 16.15?

04. UM AUTOEXAME SOBRE O AMOR. Você vive ou só exige de outros Jo 13.35?

05. UM AUTOEXAME SOBRE A MORDOMIA CRISTÃ. Medite em At 20.35 e 1 Co 4.2.

06. UM AUTOEXAME SOBRE A SANTIDADE. Reconheça I Co 6.19-20 e 2 Tm 2.20-22.

07. UM AUTOEXAME SOBRE A VANGLÓRIA. Compreenda 1 Co 10.31 e 1 Co 15.10.

08. UM AUTOEXAME SOBRE O TRABALHO. Se esforce a partir de Ef 4.28 e I Ts 4.11-12.

09. UM AUTOEXAME SOBRE O TEMPO. Seja sábio e observe Ef 5.15-17.

10. UM AUTOEXAME SOBRE A GRATIDÃO. Pelo que Deus é e faz, considere Ef 5.20.

11. UM AUTOEXAME SOBRE O LOUVOR. Antes de tudo, leia e siga o Sl 34.1.

12. UM AUTOEXAME SOBRE A SINCERIDADE. Aprecie e estabeleça Cl 3.9 como meta.

13. UM AUTOEXAME SOBRE A ASSIDUIDADE. Seja responsável com Hb 10.25.

14. UM AUTOEXAME SOBRE O TESTEMUNHO. Lembre-se de Ap 3.4-5.

15. UM AUTOEXAME SOBRE SUBMISSÃO À LIDERANÇA. Está pronto para Hb 13.17?

São quinze autoexames essenciais. Há muito mais, é claro. Entretanto, ponderar nesses aspectos redundará em crescimento espiritual ainda hoje, tal como a atitude do salmista: “sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração, prova-me e conhece os meus pensamentos; vê se há em mim algum caminho mau e guia-me pelo caminho eterno" (Sl 139.23-24).

Rev. Ângelo Vieira da Silva



BEM-AVENTURADOS OS QUE TÊM FOME E SEDE DE JUSTIÇA


“Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos”.
“Bem-aventurados vós, os que agora tendes fome, porque sereis fartos”.
(Mt 5.6; Lc 6.21a)

Jesus revelou que aqueles que têm fome e sede de justiça são bem-aventurados. É um equívoco compreender as palavras do Senhor como se referindo a alguma justiça no homem ou em suas obras. Na verdade, o Senhor censurou tal pensamento ao exortar os “fartos”: “Ai de vós, os que estais agora fartos! Porque vireis a ter fome...” (Lc 6.25a). Entenda: em termos espirituais, as Sagradas Escrituras descrevem que a justiça humana não é a justiça divina. O homem natural não é justo em si: “Mas todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças, como trapo da imundícia; todos nós murchamos como a folha, e as nossas iniquidades, como um vento, nos arrebatam” (Is 64.6). Aliás, a situação espiritual deste homem é judicialmente indefensável (Jr 2.22; Sl 49.7). Seria um engano pensar que a justiça divina se fundamenta em obras humanas. Como bem ressaltou o teólogo batista Adolf Pohl, “a justiça é dádiva, que não se conquista com esforço, e sim se recebe de presente”. Portanto, a justiça divina só pode ser imputada ao homem: “Ele creu no SENHOR, e isso lhe foi imputado para justiça” (Gn 15.6; leiam também Rm 4.3-9).

O termo “justiça” (dikaiosune, gr.) está ligado a ideia da “condição de ser aceito por Deus” ou “dar a cada um o que é devido”, esse último num sentido judicial. Portanto, a partir do contexto das bem-aventuranças, são extremamente felizes os cristãos “considerados justos pelo sacrifício de Cristo” e que comunicam tal justiça ao mundo sedento, pois é a misericórdia do Senhor a base dessa justiça. Em Cristo ou fora dEle, Deus dá a cada um o que lhe é devido. No sentido forense, judicial, os cristãos são justificados por Jesus. Ele é a justiça de seu povo: “tal como o Filho do Homem, que não veio para ser servido, mas para servir e dar a sua vida em resgate por muitos”... “Nos seus dias, Judá será salvo, e Israel habitará seguro; será este o seu nome, com que será chamado: SENHOR, Justiça Nossa” (Mt 20.28; Jr 23.6). Lembre-se: Ele pagou a nossa dívida (Is 53.5-6).

Por outro lado, a bem-aventurança também ensina que os cristãos devem viver justamente. Num sentido ético, Jesus alertou que os justificados por Deus possuem uma conduta compatível com tal graça. O próprio contexto do "sermão do monte" demonstra essa verdade: “Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus... Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus... Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste”... “Guardai-vos de exercer a vossa justiça diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; doutra sorte, não tereis galardão junto de vosso Pai celeste... buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas” (Mt 5.10, 20, 48; Mt 6.1). Como bem declarou o teólogo reformado Simon Kistemaker, “embora seja impossível que as obras justifiquem alguém, é igualmente impossível que uma pessoa justificada possa viver sem praticar boas obras”.

Finalmente, a pergunta inevitável é: qual é a promessa dessa bem-aventurança? Considerando as palavras “sede” e “fome” é certo que a promessa do Senhor é de “saciedade”. Jesus está falando de um suprimento espiritual: “Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado”... “Jamais terão fome, nunca mais terão sede...”. (Rm 8.3; Ap 7.16a). Certamente, esta é a bem-aventurança do perdão: “Bem-aventurado aquele cuja iniquidade é perdoada, cujo pecado é coberto” (Sl 32.1).

Rev. Ângelo Vieira da Silva

BEM-AVENTURADOS OS MANSOS


“Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra” (Mt 5.5).

Os grandes equívocos na interpretação do sentido de “mansos” resumem-se em fraqueza e brandura. Ora, a mansidão não é sinônima de fraqueza! Jesus não está falando daquelas pessoas visivelmente enfraquecidas, fragilizadas, passivas, com falta de perspicácia ou de caráter. A força física, seja intensa ou apática, não é fator determinante para a bênção divina. Lembre-se que um dos grandes juízes de Israel foi o fortíssimo Sansão (Jz 13.24). Igualmente, a mansidão não se refere àquela total brandura. Sim, há pessoas que interpretam a bem-aventurança aplicando-a àquele grupo de pessoas de gênio brando, pacífico, sereno, tranquilo, quieto. Todavia, o homem mais manso de sua geração pode se encolerizar (Nm 12.3; Nm 11.10-15; Nm 20.11-12). Nem o próprio Deus bondoso deixa de se indignar e se irar com o pecado dos homens (Rm 1.18). Assim, é interessante notar que o filósofo grego Aristóteles (aluno de Platão e professor de Alexandre, o Grande, século IV) definiu a mansidão como o justo meio entre a ira excessiva e a falta absoluta de ira, ou passividade.

Há um sentido espiritual em “mansos” (praus, gr.), palavra ligada às ideias de “sujeição e subordinação espirituais”, “sem algum tipo de disputa ou resistência”, ao “suportar sem amargura”. Também está bem conectada com a primeira bem-aventurança, os pobres de espírito (Is 11.4; Is 29.19). Aparentemente, a única diferença está nas relações, isto é, a primeira se refere a Deus e a segunda aos homens. Portanto, a terceira bem-aventurança ensina que são extremamente felizes os cristãos que se “submetem ao Senhor diante de qualquer situação”, mantendo no coração “à disposição de sofrer dano ao invés de causá-lo” (Simon Kistemaker), deixando tudo nas mãos do Deus vivo. Nesse sentido, os cristãos aprendem o modelo de Cristo. Jesus é o seu padrão de mansidão (Mt 11.29), pois Ele se submeteu a vontade do Pai (Jo 4.34; Fp 2.8). Desse modo, o povo de Deus entende o valor da mansidão. Além do modelo divino, o próprio Espírito Santo produz o fruto de mansidão no cristão. Esse é o seu valor prático (Ef 4.2; Cl 3.12; 1 Pe 3.4, 14; Gl 5.23; 1 Tm 6.11; 2 Tm 2.25; Tg 1.21; Tg 3.13). Em tudo isso se vê que o cristão manso é aquele que não se ressente, que não guarda rancor. A mansidão será o antônimo de “espírito vingativo”.

Qual é a promessa dessa bem-aventurança? Muito além da terra arável, o chão ou os continentes deste mundo, o texto diz que os mansos “herdarão a terra”, isto é, a nova e durável terra da justiça: “Mas os mansos herdarão a terra e se deleitarão na abundância de paz... Aqueles a quem o SENHOR abençoa possuirão a terra; e serão exterminados aqueles a quem amaldiçoa. Os justos herdarão a terra e nela habitarão para sempre. Espera no SENHOR, segue o seu caminho, e ele te exaltará para possuíres a terra; presenciarás isso quando os ímpios forem exterminados”... “Nós, porém, segundo a sua promessa, esperamos novos céus e nova terra, nos quais habita justiça”... “Porque não somente vos compadecestes dos encarcerados, como também aceitastes com alegria o espólio dos vossos bens, tendo ciência de possuirdes vós mesmos patrimônio superior e durável. Não abandoneis, portanto, a vossa confiança; ela tem grande galardão. Com efeito, tendes necessidade de perseverança, para que, havendo feito a vontade de Deus, alcanceis a promessa” (Sl 37.11, 22, 29, 34; 2 Pe 3.13; Hb 10.34-36).

Rev. Ângelo Vieira da Silva

BEM-AVENTURADOS OS QUE CHORAM


“Bem-aventurados os que choram, porque serão consolados”...
“... Bem-aventurados vós, os que agora chorais, porque haveis de rir” (Mt 5.4; Lc 6.21b).

Equivocam-se aqueles que sugerem que o choro da bem-aventurança refere-se apenas ao pranto pelo luto ou “todo e qualquer choro”. As pessoas choram por alegria e tristeza; pranteiam por diferentes situações da vida. Dos motivos mais triviais (como um time de futebol) aos mais complexos (perda de um ente querido), o ser humano se expressa pelas lágrimas. Considerar todo pranto dentro da bem-aventurança é vulgarizar a bem-aventurança. Jesus está falando de um choro específico, que produz arrependimento para a salvação: “Porque a tristeza segundo Deus produz arrependimento para a salvação, que a ninguém traz pesar; mas a tristeza do mundo produz morte” (2 Co 7.10). Ademais, apesar de a expressão grega ter sua relação com o luto, as bem-aventuranças são de teor espiritual e se seguem uma à outra. Ora, se reconheci minha pobreza espiritual na primeira bem-aventurança, choro por essa condição na segunda. Se há luto aqui, é um pesar espiritual. Daí a exortação do Senhor Jesus: “Ai de vós, os que estais agora fartos! Porque vireis a ter fome. Ai de vós, os que agora rides! Porque haveis de lamentar e chorar” (Lc 6.25).

Choram” (pentheo, gr.) refere-se ao “ser afetado profundamente”, “àquele que pranteia intensamente por alguém morto”. De fato, é o que ocorre na vida espiritual. Logo, a bem-aventurança ensina que são extremamente felizes os cristãos que, reconhecendo sua condição espiritual de morte, lamentam as consequências produzidas por seus atos pecaminosos diante do Deus vivo. A segunda bem-aventurança é uma consequência da primeira. Portanto, qualquer cristão deve prantear pela desobediência à Lei (Sl 119.136), pelas ações dos adversários (Sl 6.6-8), pelo pecado do povo (Ed 10.6). Todavia, amanhã os cristãos não mais chorarão. Tudo passará na eternidade com Deus, inclusive o pranto: “Tragará a morte para sempre, e, assim, enxugará o SENHOR Deus as lágrimas de todos os rostos, e tirará de toda a terra o opróbrio do seu povo, porque o SENHOR falou”... “Os que com lágrimas semeiam com júbilo ceifarão”... “E lhes enxugará dos olhos toda lágrima, e a morte já não existirá, já não haverá luto, nem pranto, nem dor, porque as primeiras coisas passaram” (Is 25.8; Sl 126.5; Ap 21.4).

Finalmente, pergunto: qual é a promessa dessa bem-aventurança? Ora, o riso pelo consolo providente de Deus: “Tenho visto os seus caminhos e o sararei; também o guiarei e lhe tornarei a dar consolação, a saber, aos que dele choram”... “Como alguém a quem sua mãe consola, assim eu vos consolarei; e em Jerusalém vós sereis consolados” (Is 57.18; Is 66.13). “Consolados” (parakletos, gr.) é o termo também utilizado para o Advogado Jesus e o Espírito Consolador, aqueles que se “posicionam ao nosso lado”. Haveremos de “sorrir” porque o Senhor nos consolará: “Em verdade, em verdade eu vos digo que chorareis e vos lamentareis, e o mundo se alegrará; vós ficareis tristes, mas a vossa tristeza se converterá em alegria. A mulher, quando está para dar à luz, tem tristeza, porque a sua hora é chegada; mas, depois de nascido o menino, já não se lembra da aflição, pelo prazer que tem de ter nascido ao mundo um homem. Assim também agora vós tendes tristeza; mas outra vez vos verei; o vosso coração se alegrará, e a vossa alegria ninguém poderá tirar” (Jo 16.20-22).

Rev. Ângelo Vieira da Silva

BEM-AVENTURADOS OS POBRES DE ESPÍRITO


“Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus”... “Então, olhando ele para os seus discípulos, disse-lhes: Bem-aventurados vós, os pobres, porque vosso é o reino de Deus” (Mt 5.3; Lc 6.20).

Não poderemos ser cheios enquanto não formos primeiramente esvaziados” (D. M. Lloyd-Jones). É justamente esse o ensino da primeira bem-aventurança. Naturalmente, muitos associam a bem-aventurança com uma condição exterior ou uma espiritualidade inferior. Equívocos! Ora, é certo que a condição exterior não leva alguém à felicidade real. Sabemos que os ricos eram invejados e os pobres eram humilhados no contexto de Tiago, por exemplo: “Ouvi, meus amados irmãos. Não escolheu Deus os que para o mundo são pobres, para serem ricos em fé e herdeiros do reino que ele prometeu aos que o amam? 6 Entretanto, vós outros menosprezastes o pobre. Não são os ricos que vos oprimem e não são eles que vos arrastam para tribunais?” (Tg 2.5-6). Contudo, além de uma percepção material, o livro de Apocalipse ensina como alguém pode ser pobre embora se julgue rico e como pode ser rico em meio à pobreza: “pois dizes [Laodicéia]: Estou rico e abastado e não preciso de coisa alguma, e nem sabes que tu és infeliz, sim, miserável, pobre, cego e nu”... “Conheço a tua tribulação [Esmirna], a tua pobreza (mas tu és rico) e a blasfêmia dos que a si mesmos se declaram judeus e não são, sendo, antes, sinagoga de Satanás” (Ap 3.17; Ap 2.9).

Igualmente, a bem-aventurança de Jesus não premia aqueles com uma espécie de espiritualidade inferior. “Pobre em espírito” está relacionado ao espírito da pessoa, à sua essência e estado espirituais, não aos seus atos de espiritualidade. Logo, não é esse o sentido da bem-aventurança. A vida espiritual do cristão deve ser rica: “pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, se fez pobre por amor de vós, para que, pela sua pobreza, vos tornásseis ricos”... “entristecidos, mas sempre alegres; pobres, mas enriquecendo a muitos; nada tendo, mas possuindo tudo” (2 Co 8.9; 2 Co 6.10). 

Humildes/pobres” (ptochos, gr.) refere-se àquele que é “necessitado”. Assim, associando-se a expressão “de espírito”, interpreta-se que são extremamente felizes os cristãos que se convenceram de sua pobreza espiritual, tornando-se conscientes de sua miséria e necessidade do Deus vivo, tal como Davi: “Eu sou pobre e necessitado; ó Deus, apressa-te em valer-me, pois tu és o meu amparo e o meu libertador. SENHOR, não te detenhas!” (Sl 70.5). Ora, Jesus quer cristãos sem orgulho (Lc 18.13; Pv 16.19), que admitem sua condição (Rm 7.14), temem a Deus (Is 66.2) e se arrependem de seus pecados (Jl 2.13; Mt 3.2): “Melhor é ser humilde de espírito com os humildes do que repartir o despojo com os soberbos”... “Porque bem sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado”... “Porque a minha mão fez todas estas coisas, e todas vieram a existir, diz o SENHOR, mas o homem para quem olharei é este: o aflito e abatido de espírito e que treme da minha palavra”... “Rasgai o vosso coração, e não as vossas vestes, e convertei-vos ao SENHOR, vosso Deus, porque ele é misericordioso, e compassivo, e tardio em irar-se, e grande em benignidade, e se arrepende do mal”. Naturalmente, assim serão “ricos de espírito” com uma promessa inabalável. Sim, a bem-aventurança tem sua promessa. Qual é? Obviamente, a posse do reino dos céus: “porque deles/vosso é o reino dos céus”.

Rev. Ângelo Vieira da Silva

O REINO DE CRISTO, O REI


A palavra “reino” remete a um “território politicamente organizado e governado por um rei”. Ora, o Reino de Deus é governado por Cristo, o Rei; é o Reino de Cristo, uma realidade espiritual tanto presente como futura. O Reino presente se refere à implantação e a expansão do Reino de Cristo na Terra, ainda que não plenamente. Ou seja, Cristo veio à Terra e implantou o Reino dos céus, ainda que não possamos gozar totalmente de todos os privilégios que essa condição pode proporcionar (ainda...). Assim, pregamos o Reino de Deus já presente.

Complementando o sentido do Reino presente, temos a característica futura do Reino dos céus. O Reino futuro é o Reino em seu estado pleno; aquele que esperamos ansiosamente. É o gozo completo que está preparado para todos aqueles que amam a Deus (1 Co 9.6). O Reino de Deus, ou o Reino dos céus, é a realidade espiritual que veio com Jesus, como cumprimento dos planos de Deus para a história, do qual os profetas do Antigo Testamento falaram com freqüência (Is 11.1; Is 12.6). Nesse sentido, o Reino foi profetizado pelos profetas, foi inaugurado na primeira vinda de Cristo (o Reino se mostrava presente com Jesus e seus milagres são sinais dele) e chegará ao seu estado pleno na segunda vinda de Cristo.

Os conceitos acima mencionados podem ser explicados mediante duas parábolas: a parábola do grão de mostarda e a parábola do fermento (Mt 13.33; Lc 13.20-21). Essas parábolas são usadas por Jesus para falar a respeito do fenomenal crescimento do Reino dos céus, do Reino de Deus, que é o propósito, o porquê da existência do Reino de Deus em nossa era. As duas parábolas formam um par e, na verdade, são duas faces de uma mesma moeda. O Reino de Deus existe nesta era para crescer, para se expandir. A parábola do grão de mostarda retrata o crescimento do Reino em extensão e a parábola do fermento descreve a intensidade desse crescimento. A verdade é que o Reino de Deus será pregado e crescerá - assim como a mostarda (Mt 13.31) - até que o Filho do Homem, agora reinando no céu, volte para reunir os seus eleitos de todas as nações e seu Reino seja plenamente instaurado. Portanto, a parábola do grão de mostarda e do fermento nos dão claramente a idéia do porquê da existência do Reino de Deus: esse Reino foi inaugurado, está em processo e será consumado. Tal verdade aplica-se às duas parábolas, uma vez que se fala de semeadura e crescimento em uma visão escatológica.

O aspecto futuro do Reino de Cristo, o Rei, é bem resumido pelo teólogo reformado Louis Berkof, quando esse enfatiza que a Bíblia favorece a idéia de que a presente dispensação do Reino de Deus seguir-se-á imediatamente ao Reino de Deus em sua forma consumada e eterna, não meramente temporal (Is 9.7, Dn 7.14, Lc 1.33, Hb 1.8, Hb 12.28, 2 Pe 1.11, Ap 11.15). Logo, à luz dessas considerações, pode-se dizer que a plenitude do “Reino de Deus não é o resultado de um desenvolvimento gradual da natureza, nem um produto do esforço humano, pois embora o Reino dos céus seja como uma semente de mostarda [isto é, como seu crescimento], como o fermento e como o grão de trigo, ele se desenvolve sem o conhecimento e sem a contribuição do homem (Mc 4.27). Paulo plantou e Apolo regou, mas o crescimento veio de Deus (1 Co 3.6)”.

Devemos esperar o retorno do Filho do Homem com alegria. Juntamente com Ele reinaremos, pois somos o povo eleito de todas as nações para um Reino pleno de poder e glória. Louvado seja o Deus Todo-poderoso por esse privilégio gracioso concedido pelo Rei do reis e Senhor dos senhores.

Maranata!

Rev. Ângelo Vieira da Silva

ENTREGUE SUA VIDA A DEUS


A leitura devocional do Salmo 22 atinge seu clímax quando Davi declara: “A ti me entreguei desde o meu nascimento; desde o ventre de minha mãe, tu és meu Deus”. Entregar a vida a Deus é tão essencial na vida do homem que o salmista a coloca como uma decisão “tomada” em seu nascimento, ou melhor, desde o ventre materno (Is 46.3-4; Is 49.1; Gl 1.15). Necessariamente, não pretendo abordar essas últimas idéias aqui (são muito profundas na teologia bíblica e sistemática para uma simples pastoral), todavia, gostaria de levá-lo a refletir sobre o ato de entregar sua vida ao Senhor Deus Todo-Poderoso.

Entregando-se ao Senhor, reconhecemos que Ele cuidará de nós (Sl 40.7), nos suprirá (1 Pe 4.11); nada nos faltará (Sl 23.1). NEle, todas as nossas necessidades são saciadas (Fp 4.19), pois, como um Pai que se compadece dos filhos, assim o Senhor tem misericórdia de nós (Sl 103.13). Bom, temos o conhecimento; porém, teremos ações concretas que representam essa entrega? Pensemos em um triplo sentido para a palavra “entregar” e alguns exemplos bíblicos que o acompanha.

1) ENTREGAR SIGNIFICA DEVOLVER.

Entregar a vida para o Senhor é o mesmo que devolvê-la a Deus, afinal, ela não nos pertence (Sl 24.1). Obviamente, isso significa que precisamos negar a nós mesmos (Mt 16.24) e deixar Jesus conduzir “nossa” vida para sua própria glória. Lembremos de Ana, esposa de Elcana, e o que ela fez em relação a Samuel: ela o devolveu ao Senhor (1 Sm 1.1-28). Apesar de ter sido o pequeno filho resposta de oração e um grande presente, ela deveria cumprir seu voto e devolvê-lo.

2) ENTREGAR SIGNIFICA CONSAGRAR.

Consagrar a vida a Deus significa torná-la separada para Ele, das trevas do mundo e seus desejos. Foi o que aconteceu com o profeta Jeremias (Jr 1.5). Antes mesmo de nascer, Deus já o havia separado (Sl 71.5-6), amado e o constituído profeta às nações (Rm 8.29). A vida de Jeremias pertence a Deus e, por isso, é consagrada a Ele. É o mesmo conceito de santificação. Não significa uma vida sem pecado, mas que luta contra o pecado em direção à santidade e cumprimento dos planos de Deus em nossa vida carente da glória divina. 

3) ENTREGAR SIGNIFICA CONFIAR.

Pensar em confiança é perceber a fragilidade humana. Na maioria dos casos, confiamos nossa vida ao Senhor, “desconfiando”. Talvez o melhor sentido de confiança esteja no Salmo 37.5: “Entrega o teu caminho ao SENHOR, confia nele, e o mais ele fará”. Não foi o que aconteceu com Abraão (Gn 22.7-8)? A confiança do patriarca era tão grande no poder de Deus que ele estava pronto para sacrificar seu único filho em obediência. Somos filhos de Abraão? Sim! Temos a mesma confiança? (...). Aprendamos a confiar.

Enfim, posso afirmar sinceramente: não existe nada melhor do que entregar nossas vidas ao Senhor e deixá-lo cuidar de nós. Pense nisso.

Rev. Ângelo Vieira da Silva
UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE A ADORAÇÃO

UMA BREVE REFLEXÃO SOBRE A ADORAÇÃO







Adoração…  Muito mais que um mero tema, adoração é um estilo de vida. A partir da Palavra de Deus podemos fazer associações, mostrar a influência e a organização da música em relação ao ser humano, uma vez que todos os homens ouvem e cantam música. Contudo, a partir do contexto hodierno, encontrar-se-ão perigos em relação à adoração, à música como poder de persuasão “substituindo”, por exemplo, a atuação do Espírito Santo e tocando apenas parte das pessoas. Assim, o objetivo dessa breve pastoral é conclamar os cristãos a cuidarem de suas vidas em relação à música, com suas nuances, na adoração ao nosso Deus. A verdade é que “uma igreja consciente sempre procurará selecionar suas canções, canalizando-as sempre à adoração do Senhor”.

Segundo o reformador Martinho Lutero a música é um dos mais magníficos e deleitáveis presentes que Deus nos tem dado. João Calvino não ignorava o poder da música; antes, compreendia que o cantar tem uma conotação de lembrança e estímulo espiritual para aquele que canta, como o “falar entre vós com salmos” recomendado por Paulo em Efésios 5.19. O reformador seguia o pensamento de Agostinho que demonstrava de forma enfática a preocupação em não se deixar conduzir pela melodia, sem a devida meditação na letra, ou seja, ter a consciência daquilo que se fala, se canta e se ouve. “Os nossos améns não podem ser transformados em vãs repetições desconexas, antes devem ser fruto da fé e da compreensão do que foi falado e cantado”. É por isso que os cânticos na adoração precisam ter um grande apelo didático, objetivando, inclusive, a fixação das Escrituras Sagradas.

Notamos que nossa época está repleta do que significa worship. Esse termo vem do anglo-saxão (ainda que tenha sofrido muitas mudanças ao longo dos anos) significando “atribuir valor, mérito a alguém ou alguma coisa”. Espera-se que os cristãos possam, verdadeira e espiritualmente, atribuir valor e mérito ao único que é digno de receber: o Deus trino. O culto é para Ele e deve ser fruto de uma nova vida, gratidão e louvor, sendo sempre embasado na Palavra do Senhor. Portanto, podemos declarar: o culto e a adoração ao nosso Deus são caracterizados pela submissão às Escrituras: “procurai progredir, para a edificação da igreja. Que farei pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente; cantarei com o espírito, mas também cantarei com a mente” (1 Co 14.12b, 15).
Entenda também que:

1) A ADORAÇÃO É UMA DECLARAÇÃO, NÃO UMA SENSAÇÃO.

É evidente que o “sentimento” está e precisa estar presente na adoração de um Deus amoroso e misericordioso. Mas, por que a adoração não é uma sensação? Diferencio sentimento de sensação. Basicamente, por definição, uma sensação é “uma grande impressão devido a um acontecimento raro”. Seria rara a sensação da presença de Deus quando nós o adoramos? Creio que não, pois é no processo de adoração que Deus comunica sua presença aos homens. É por isso que a adoração é uma declaração, isso é, através dela declaramos que o Senhor reina, sua graça é manifesta e está presente em todos nós (como costumamos cantar). Na adoração declaramos nossa fé, nossas convicções. Na adoração declaramos a glória de Deus. Pergunto: o que você mais vê hoje na adoração: declaração ou sensação?

2) A ADORAÇÃO É UMA REAÇÃO, NÃO UM CLIMA.

Clima pode ser definido como ”o conjunto de características de um ambiente”. É triste reconhecer a possibilidade de cristãos desejarem criar uma atmosfera propícia para que as pessoas chorem e lamentem exacerbadamente, sem, contudo, trazerem mudanças genuínas em suas vidas. É possível tocar as emoções sem trazer mudança real nos corações. O clima é tremendo para Deus, mas não há almas temendo a Deus. Assim, toca-se os sentidos e não a razão. Creio que a adoração é uma reação ao entendimento do ser de Deus (razão e emoção juntas), isso é, adoramos ao Senhor pelo o que Ele é, pelo o que Ele fez, faz e fará em nós. Em suma, adoramos a Deus porque entendemos que só Ele é digno de ser adorado emocional e racionalmente.

Pense nisso.
Rev. Ângelo Vieira da Silva