O 21 de janeiro de cada ano é o Dia Mundial da Religião. Do grego “threskeia” e do latim “religare”, o termo designa a ligação do homem com seu “Deus”. Aparentemente, desde sua criação em 1949 por uma assembléia da religião persa Bahá’í, o objetivo seria a unidade entre todas as religiões do mundo. Beiraria a utopia essa aspiração? Creio que sim.
A maioria das religiões chama para si a verdade e são fontes de muitos conflitos políticos, éticos, morais, filosóficos, dentre outros. Entre elas a verdade se torna relativa. Se as tradições e textos sagrados das religiões ditam a fé em cada sistema é fácil compreender que a maioria dos princípios religiosos serão desiguais entre si; haverá óbvias divergências entre a Bíblia, o Rig-Veda, a Tradição Romana, a Torá, o Alcorão, o Livro dos Espíritos, os Vedas (como o Mahabharata), o Zend Avesta, etc... Poucos serão os preceitos comuns.
Neste texto, entretanto, pretendo não criticar essa ou aquela religião, apesar de crer e ter uma cosmovisão protestante reformada. Sim, é difícil falar de religião nesse escopo, mas arriscarei, uma vez que a reflexão sobre o papel das religiões no mundo é abundantemente atraente nesse dia e mês. Sugiro como palavra-chave desta meditação o RESPEITO.
É extremamente perigoso pensar que as pessoas de uma religião diferente da qual adotamos não mereçam nossa atenção, respeito e até amor. Muitos agem assim. Por considerarem sua religião a verdadeira, fogem do campo legítimo da discussão saudável de idéias e preceitos para afrontar o próximo, guerrear e esmagá-lo com jugos que, na maioria dos casos, nem mesmo sua religião endossa. Isso não é humano e não pode ou deveria ser “religião”. A doutrinação tolerante precisa ser essencial às religiões.
Creio que o Dia Mundial da Religião, para alguém religioso como eu (e muitíssimo outros pelo mundo), precisa ser um dia de respeito e reflexão, um momento de enfatizar as inúmeras contribuições excelentes que religiões prestaram à humanidade ao longo dos séculos e lembrança dos seus pecados e erros – sim, por que não? – a serem esclarecidos e abandonados para a posteridade. Sinceramente, não acho que exista religião perfeita.
Tolerância? Prefiro a palavra respeito, apesar de ouvirmos muito sobre a intolerância religiosa. O Dia da Tolerância é outro e devo lembrá-lo, afinal, “todas as pessoas têm direito à liberdade de pensamento, consciência e religião” (art. 18 da Declaração de Paris em 1995; instituído pela UNESCO).
Quanto aos cristãos, especificamente os protestantes reformados como eu, relembro os ensinamentos na carta de Tiago 1.26-27: “Se alguém supõe ser religioso, deixando de refrear a língua, antes, enganando o próprio coração, a sua religião é vã. A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai, é esta: visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se incontaminado do mundo”. Admitindo as relações entre fé e ações legítimas que a Igreja precisa demonstrar, compreendam, a religião pura e sem mácula envolve ortodoxia e ortopraxia. O grande conflito que vejo entre nós, cristãos protestantes reformados, é a incoerência entre a mensagem que pregamos e os caminhos que tomamos. Muitos outros são melhores do que nós nesta relação; e nem são cristãos... Pense nisto!
Rev. Ângelo Vieira da Silva
1 comments:
Vem também do Latim, que é um pouco a minha praia, ‘religio (- onis), a casadinha de ‘religare’ com ela. Etimologicamente não existe; historicamente, ocorre.
O sentido Católico comumente usado em filosofia Gregoriana é: ‘quae deos deasque vel res supernaturales exsistere habet’.
Uma ‘googlada’ e a expressão aparece com o sentido de ‘existência de deuses; ou, o sobrenatural existe e tem como a comunicação entre cá e lá’. (tradução livre). O ‘salto’ para casar a ideia com ‘crenças e dogmas’ (Cristãs ou não) é quase que automático.
Claro, embutido está aí ‘ritos’ (e preceitos morais) próprios de cada uma das religiões. E com isso sai-se com qualquer coisa que liga o homem à divindade. Admitindo-se, aí, o princípio comum de todas as religiões que admitem uma força ‘lá fora’, ‘externa’, ‘superior’, ‘sobrenatural’, para muitos, até criadora do Universo.
Optou o autor por ‘respeito’ e não ‘tolerância’, pela óbvia razão de, sendo Cristão e Reformado, tolerância seria quase que admitir por tabela que as outras religiões são ‘verdadeiras’ (eu usei a palavra, ele não) e que só Cristianismo existiria como, ‘única e verdadeira’ (também ele não disse isso).
Aduz, referindo-se à declaração da UNESCO em 1995 em Paris, sob mandato da ONU, que é comemorado em 16 de Novembro como sendo o ‘Dia da Tolerância’ que, Art. 18, “Enfatizando as responsabilidades dos Estados-Membros [junto à ONU, daí o mandato da UNESCO] para desenvolver e encorajar o respeito pelos direitos humanos e [as] liberdades fundamentais para todos, sem distinção de sexo, raça, língua, origem nacional [curioso, que no Inglês do documento o sujeito que nascido em um país e requerendo nova cidadania noutro, não tem na expressão em Inglês, ‘national origin’, o correspondente adequado], religião ou deficiência [pelo menos, ‘incapacidade física’ de qualquer natureza], e o combate a intolerância” (tradução livre).
Sim, o texto da UNESCO trata de combater a 'intolerância religiosa’ que o autor prefere ‘respeito’ pelas razões óbvias por ele elencadas (Cristão – Protestante – Reformado).
O Dia da Tolerância é realmente outro, portanto.
Mas isso não exclui que uma das questões fundamentais, inclusive agasalhada na Constituição Brasileira/1988, é justamente a intolerância religiosa, não existindo, ao que me consta, um ‘Dia de Respeito’ às religiões.
A intolerância é o gênero, como se diz em linguagem jurídica, mas nem aí existindo um dia de respeito a delimitar ou adequar, posto que respeito estaria, por necessidade, embutido na ideia de tolerância, ou contra a qual (ou quais religiões) se quer opor com atos de intolerância.
A preferência por ‘respeito’ é um direito que assiste ao autor, muito embora o apreço pelo texto da UNESCO é desfocado que se lê o sentido de 'respeito'.
A meu juízo, deveria, sim, como Reformado, justificar sua posição pela opção de 'respeito' no lugar do gênero, 'tolerância'. O problema é que a audiência dele (leitores) ficaria reduzido aos 'seus' (Reformados).
Sendo assim, ‘faz sentido’ para ele a escolha entre os ‘protestantes reformados’ e ‘ortodoxia/ortopraxia’. Afinal, o conflito não se dá entre Cristianismo e os ‘outros’, posto que os outros, em razão do sentido peculiar de 'respeito' dado pelo autor são religiões simplesmente inexistentes como tais.
Podem até ter CNPJ, instituições, doutrinas, etc., mas com existência de natureza, digamos assim, ontológica, bem, aí reserva-se essa apenas para o Cristianismo.
“Pense nisto!”
Pensei. E cordialmente discordei do autor.
PS. A propósito, “Problems and Principles in Preaching Historical Texts”, Sideny Greidanus (tese doutorado, 1970) de maneira indelével, que o Protestantismo Brasileiro, até por questão de sobrevivência (pelo menos no seio da IPB) tenta sustentar: a ideia de ‘monolítico’, isto é, como se a palavra ‘Reformado’ tivesse, em algum momento alguma coisa de ‘unidade’. Algo (no Protestantismo na sua vertente Reformada) semelhante ao conjunto doutrinário da Igreja Católica. Que também, já foi há muito para as calendas.
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